sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

HOMENAGEM: VITOR GUERRA (PORTUGAL/MOÇAMBIQUE)

PUREZA




VITOR GUERRA (PORTUGAL/MOÇAMBIQUE)



Ouvia-se ao longe
as folhas das árvores
o rugir do vento
o tinir da chuva


E num quarto
de um pequeno hotel
de uma artéria qualquer
na velha cidade


Eu e tu
corpo contra corpo
tentávamos fugir
à solidão que nos rodeava

Procurávamos esquecer
a velha monotonia do dia-a-dia
E na sofreguidão dos instantes
acabamos por esquecermo-nos
de nós próprios


As minhas mãos percorriam
de ponta a ponta o teu corpo
Voltamos
então
momentaneamente à realidade


Ouvia-se ao longe
o choro agudo
duma criança com fome
o estalido grave duma porta
o estampido dissonante duma bala
e o baque seco
de um fardo a cair no passeio


Um grito de horror
e de medo
num País escravizado e oprimido


Embrenhamo-nos
então
de novo
na nossa árdua tarefa de amar


E o meu último pensamento
antes de me afundar
no abismo da inconsciência
foi:
Que talvez o nosso amor furtivo
fosse a única coisa pura deste mundo



*VITOR GUERRA: nasceu em 3 de agosto de 1968, em Lisboa, Portugal. Mora em Maputo, Moçambique. Diretor de Operações na empresa Altel. Formado em Engenharia, Universidade Eduardo Mondlane.

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